TEMER REÚNE-SE HOJE com presidentes da Câmara, do Senado e do TSE em encontro considerado como de salvação nacional

Captura de Tela 2017-03-15 as 09.34.56          Sob o impacto da entrega ontem de 320 pedidos que fazem parte da nova lista do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ao Supremo Tribunal Federal (STF), o presidente Michel Temer conduz hoje no Planalto uma reunião que já vem sendo chamada de “salvação nacional”.

Ao receber os presidentes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Gilmar Mendes, do Senado, Eunício Oliveira (PMDB- CE) e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), Temer busca uma alternativa ao financiamento de campanhas eleitorais e uma forma de evitar a criminalização das doações privadas, sejam via caixa 1, com registro oficial, ou caixa 2, sem constar na prestação de contas das campanhas.

A discussão ganhou novo fôlego em Brasília desde que o STF tornou réu o senador Valdir Raupp (PMDB-RO), há uma semana. Conforme os ministros da 2ª Turma, há provas para julgar Raupp por recebimento de propina por meio de uma doação legal, declarada à Justiça Eleitoral.

– Depois de Raupp, o STF criminalizou todas as campanhas – critica o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA), presidente da comissão da reforma política.

O entendimento gerou pânico disseminado no Congresso e acelerou os conchavos em torno da votação de anistia generalizada aos políticos que confessarem o uso de caixa 2 em eleições. Com o aval do Planalto, a manobra tem fiadores no PT, PSDB, PMDB e PP, principais legendas do país. Para angariar apoio de pequenos partidos, acena-se com o engavetamento da cláusula de barreira, mecanismo que ameaça a existência das siglas de menor porte.

– A questão da anistia está escancarada, não é mais segredo. Não apoio, mas sei que, tendo a garantia do mínimo de votos, governo e oposição vão tentar votar – afirma o deputado Jerônimo Goergen (PP-RS).

Para aprovar o texto com rapidez e sem o desgaste de ampla discussão na comissão da Reforma Política, a ideia é incluir uma emenda em algum projeto que já esteja em tramitação no Congresso. Até agora, a proposta de mudança na lei dos partidos políticos, que está sob regime de urgência na Câmara, é favorita para incubar a emenda.

Os parlamentares preparam um texto semelhante ao aprovado no projeto da repatriação, no qual ficavam anistiados os crimes de sonegação de impostos e evasão fiscal em troca do pagamento de tributos e multas sobre o dinheiro regularizado. Dessa forma, quem admitisse um eventual uso de caixa 2 não poderá mais ser investigado pelo delito, a não ser que haja outros indícios de crimes correlatos.

Até mesmo quem não advoga abertamente pela anistia tem buscado formas de diferenciar o caixa 2 de casos de corrupção. Nos últimos dias, esta tese ganhou a adesão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, do ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo e de Gilmar Mendes. Todos afirmaram que é preciso diferenciar o que seria um mero ilícito contábil de crimes mais graves, como lavagem de dinheiro e pagamento de propina, como entendem os procuradores da Lava-Jato.

JURISTA ALERTA PARA VEDAÇÃO A AUTOANISTIA

A questão irá levantar controvérsia jurídica. Juristas consagrados, entre eles o ex-ministro do STF Carlos Ayres Brito, têm afirmado que a Constituição veda autoanistia, o que ficaria configurado caso o Congresso aprove lei beneficiando seus próprios integrantes. Ex-relator do pacote de 10 medidas contra a corrupção na Câmara – que acabaria desfigurado em plenário e voltaria a tramitar do zero por determinação do Supremo –, o deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS) tem opinião semelhante ao jurista:

– Uma anistia é inócua porque não será possível anular o efeito da lei de lavagem de dinheiro. O Supremo não vai aceitar isso.

A despeito dos embates em torno da eventual ilegalidade da proposta, não há no Congresso movimentos com força suficiente para barrar a iniciativa. Após aprovado pela Câmara e pelo Senado, o texto seguirá para sanção de Temer. Em novembro do ano passado, quando o assunto também ganhou força no Congresso, o presidente convocou uma entrevista coletiva às pressas e em pleno domingo para dizer que vetaria qualquer tentativa de perdão ao caixa 2. Sua posição agora ainda é uma incógnita.

fabio.schaffner@zerohora.com.br guilherme.mazui@gruporbs.com.br

FÁBIO SCHAFFNER GUILHERME MAZUI RBS BRASÍLIA

AS DIFERENÇAS
Caixa 1
Irrigado com recursos doados oficialmente, com declaração de origem à Justiça Eleitoral
Caixa 2
Irrigado com recursos doados clandestinamente, sem declaração de origem à Justiça Eleitoral
AS INTERPRETAÇÕES
Na Lava-Jato Os procuradores sustentam que tanto doações via caixa 1 quanto as que ingressaram em caixa 2 podem representar corrupção. Na maioria dos casos, o caixa 2 tem sido caracterizado nas denúncias apresentadas à Justiça pelo Ministério Público Federal como lavagem de dinheiro obtido em crimes conexos, como fraudes em licitações, superfaturamento de obras e enriquecimento ilícito, entre outros.
No Supremo No julgamento do mensalão, os ministros rejeitaram a tese de que a maior parte dos recursos movimentados se tratava de caixa 2 eleitoral, e decidiram pela configuração de lavagem de dinheiro fruto de corrupção. Agora, nas provas coletadas na Lava-Jato contra o senador Valdir Raupp (PMDB-RO), a Corte entendeu que mesmo recursos declarados no caixa 1 podem configurar pagamento de propina. Dessa forma, Raupp responde ação penal por corrupção e lavagem de dinheiro.
No Congresso Assustados com a investida da Lava-Jato, os parlamentares discutem anistia a quem admitir ter feito caixa 2 em campanhas eleitorais. Para deputados e senadores, caixa 2 é mera irregularidade, pela qual os recursos manipulados nessa contabilidade paralela apenas não foram declarados à Justiça Eleitoral. Dessa forma, querem evitar penalizações criminais e, sobretudo, ter de confessar a origem do dinheiro, muitas vezes obtido de forma ilícita.