Tabela de frete, acordo EUA-China, concessões e licenciamento ambiental prometem debates e novidades ao longo do ano
O ano está só começando, mas o agronegócio está cheio de assuntos muito importantes que devem avançar em 2020. Globo Rural listou 10 deles. Alguns foram debatidos ao longo de 2019, mas ficaram pendentes. Outros já tiveram novidades em janeiro deste ano. Confira!
1. Tabela de frete
Fruto da greve dos caminhoneiros que parou o país em 2018, a tabela coloca preços mínimos para o frete rodoviário no país. As representações do agronegócio se manifestaram contrárias, argumentando que seria um intervenção no mercado.
A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) questiona no Supremo Tribunal Federal (STF) a constitucionalidade da tabela, o que ainda está pendente de julgamento, previsto para fevereiro deste ano. Até a definição do STF, nenhuma instância da Justiça pode tomar decisão favorável ou contrária à tabela.
Na semana passada, o governo federal divulgou resolução com mudanças na metodologia de cálculo dos preços mínimos e uma nova tabela de frete. Passam a ser considerados fatores como a diária dos caminhoneiros e a obrigação do pagamento de frete de retorno. Os valores foram reajustados entre 11% e 15% e entraram em vigor na segunda-feira (20/1).
Representantes do agronegócio criticaram a nova tabela. A Associação Brasileira da Indústria de Óleos Vegetais (Abiove), que representa as esmagadoras de soja, avaliou que o reajuste aumenta custos e gera burocracia. A Confederação Nacional da Indústria (CNI) ponderou que a tabela agrava distorções no transporte de carga e afeta os preços.
Para o sócio da área de agronegócio do escritório Mattos Engelberg Advogados, Frederico Favacho, o momento é propício para o STF julgar a ação. Diante da expectativa de safra recorde, o mercado está se ajustando e a última tentativa de greve dos caminhoneiros fracassou.
“O STF pode declarar que o tabelamento é inconstitucional, mas que uma tabela de custos não é inconstitucional porque ela ajuda o caminhoneiro a não trabalhar abaixo do preço de custo, mas não é tabelamento porque o mercado se adequa e continua negociando livremente”, avalia.
2. Acordo entre EUA e China
A recente assinatura da primeira fase do acordo comercial entre Estados Unidos e China, no último dia 15 de janeiro, tende a trazer impacto sobre o comércio agropecuário global e ao Brasil, que tem nos chineses seu principal parceiro comercial e nos americanos importantes concorrentes.
Os chineses se comprometeram a comprar US$ 32 bilhões a mais em produtos da agropecuária americana em dois anos, tomando por base as exportações de 2017, de cerca de US$ 24 bilhões: US$ 12,5 bilhões no primeiro ano e US$ 19,5 bilhões no segundo.
Entre os produtos, soja, milho, trigo algodão, carnes, itens de interesse do Brasil que, em função da própria guerra comercial, ganharam espaço no mercado chinês. No longo prazo, ainda será negociada a chamada fase 2 do acordo entre os dois países.
Nesta terça-feira (21/1), a China garantiu que as compras de produtos agrícolas dos EUA não vão impactar as importações provenientes de outros países. Também assegurou que vai expandir importações com base em condições de mercado e em linha com as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC).
3. Moratória da soja
Assinada para impedir a compra do grão de áreas de desmatamento na Amazônia, a Moratória da Soja voltou às discussões em 2019. Representações de produtores querem o fim do acordo, argumentando que nenhuma iniciativa deve estar acima do Código Florestal.
A Aprosoja Brasil considera a possibilidade de abrir processo no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). A indústria defende a manutenção da moratória pelo menos até que se consiga um meio que considera eficiente de verificar a procedência da soja produzida. Em entrevista à Globo Rural, os dois lados colocaram seus pontos de vista.
Em novembro passado, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, comentou o assunto. “Eu acho um absurdo. Nós temos como mostrar onde a nossa soja é produzida e se pode ser produzida naquele local. O Brasil tem hoje o Código Florestal, que é hoje uma das leis mais rigorosas do mundo, onde o produtor tem que manter de 20% a 80% da sua propriedade em matas nativas. Eu acho que precisa de um entendimento. Precisamos mostrar. Ter dados claros para comprovar e para que o Brasil não sofra como vem sofrendo”, disse ela.
4. Lei Kandir
A chamada Lei Kandir, que isenta produtos destinados à exportação da cobrança de Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), também foi bastante debatida em 2019. Mas está pendente uma solução, o que preocupa o setor do agronegócio, que teme perder competitividade com uma eventual taxação de vendas externas.
Levantamento da Aprosoja Brasil aponta que a produção de soja seria 34% menor se não houvesse o incentivo às exportações. A discussão ganhou força com a tramitação da Proposta de Emenda Constitucional 42/2019, que extingue a Lei Kandir.
A Frente Parlamentar Agropecuária (FPA) é contra. Em outubro, em uma reunião do colegiado, em Brasília (DF), o relator, senador Vital do Rêgo, disse que as exportações do agro não seriam tributadas. O texto está na Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal (CCJ).
5. Energia solar
O assunto está em discussão em meio à revisão da Resolução 482, da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), que estabelece as regras para a geração distribuída no Brasil. A Agência realizou consulta pública, encerrada em 30 de dezembro de 2019.
O presidente Jair Bolsonaro se manifestou contrário à decisão da Aneel, embora ressalte que a Agência tem autonomia para decidir. E recebeu apoio dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP).
Em evento político, Bolsonaro disse que a decisão sobre a energia solar no Brasil foi difícil e que o governo teve que enfrentar lobbies fortíssimos. Um relatório do Ministério da economia chegou a estimar um custo de R$ 56 bilhões para os consumidores brasileiros caso fossem mantidos os benefícios para a energia solar, números contestados pelo setor.
Representantes da cadeia produtiva da energia fotovoltaica argumentam que ela gera mais benefícios do que custos para o país. E avaliam que uma mudança nas regras pode inibir investimentos que, no campo, têm crescido nos últimos anos.
De acordo com dados da própria Aneel, de 2013 a 2019, a potência instalada acumulada no meio rural é de 208,89 Megawatts (MW). Em 2017, foram instalados apenas 9,07 MW. Em 2019, foram 159,27 MW.
6. Navegação de cabotagem
Discutido entre representantes do governo federal, do setor logístico e de segmentos econômicos interessados no assunto, entre eles o agronegócio, o programa de incentivo à navegação de cabotagem, chamado de BR do Mar, ainda é aguardado.
A intenção do Ministério da Infraestrutura é “atacar” os principais entraves que, de acordo com especialistas, impedem um crescimento maior do transporte de cargas pela costa brasileira. Entre as dificuldades, estão custos e obrigações trabalhistas, tributação sobre o combustível dos navios e importação e afretamento de embarcações.
Em entrevista à Globo Rural, em novembro de 2019, o secretário nacional de Portos e Transportes Aquaviários, Diogo Piloni, disse que o governo considerava a possibilidade de fatiar o programa, mas que, até então, o modelo legislativo não estava definido.
7. Concessões de infraestrutura
Está prevista para este ano uma série de leilões de concessão de infraestrutura por parte do governo federal, com a previsão de conceder 44 ativos. No modal rodoviário, está entre os destaques a BR-163 no trecho entre Sinop (MT) e Miritituba (PA).
No modal ferroviário, as prioridades são dois projetos: a Ferrogrão, para ligar o Centro-Oeste e o Norte do país, e a Ferrovia de Integração Oeste-Leste, conhecida como Fiol, na Bahia. Entre os portos, estão previstos leilões de terminais em Santos (SP), no Porto Organizado de aratu/Candeias, na Bahia, e no de Itaqui, no Maranhão.
A expectativa é de que os projetos de concessão de portos, aeroportos, rodovias e ferrovias alcancem R$ 101 bilhões em investimentos durante o período de duração dos contratos. Em 2019, foram vendidos 27 ativos, que devem resultar em R$ 9,4 bilhões em investimentos e R$ 5,9 bilhões em outorgas.
Governos estaduais também têm anunciado concessões para a iniciativa privada. Em São Paulo, foi realizado o leilão do corredor Piracicaba-Panorama, de quase 1,3 mil quilômetros de rodovias no interior do Estado. O lote foi arrematado com uma proposta de outorga fixa de R$ 1,1 bilhão na quarta-feira (8/1).
8. Licenciamento ambiental
Apoiado pela Frente Parlamentar Agropecuária (FPA), o Projeto de Lei do Senado (PLS 168/2018) que cria a Lei Geral de Licenciamento Ambiental foi debatido ao longo de 2019, mas não foi votado. O projeto estabelece as normas gerais para a liberação de atividades ou empreendimentos com potencial de poluir ou degradar o meio ambiente, com a justificativa de tornar o processo menos burocrático e mais ágil.
Entidades ligadas a questões ambientais criticam, sob o argumento de que seria um afrouxamento dos processos de licenciamento no país. O texto está na Comissão de Constituição e Justiça do Senado (CCJ).
No documento “Perspectivas 2020”, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) avalia que uma nova legislação sobre licenças ambientais trará mais segurança jurídica ao setor, facilitando a contribuição da agropecuária para o cumprimento das metas estabelecidas pelo Brasil no Acordo do Clima de Paris.
“O projeto, que deverá ser aprovado no primeiro semestre de 2020, adequa o processo de licenciamento ambiental às dinâmicas das atividades agropecuárias, facilita e agiliza a obtenção das licenças ambientais por parte dos produtores rurais”, diz o texto. Na Câmara, está em tramitação o Projeto de Lei 3729/2004 sobre o mesmo tema.
9. Cadastro Ambiental Rural (CAR)
Proprietários rurais que ainda não fizeram o Cadastro Ambiental Rural (CAR) e pretendem ter acesso ao Programa de Regularização Ambiental (PRA) devem declarar as informações até 31 de dezembro deste ano.
O prazo foi estabelecido por lei sancionada em outubro de 2019. O mesmo texto torna o CAR permanente, uma medida considerada necessária em função de mudanças que podem ocorrer nas propriedades rurais ao longo do tempo, como ampliações e divisões de área.
Dados atualizados até o dia 30 de novembro do ano passado pelo Serviço Florestal Brasileiro (SFB) contabilizam 6,4 milhões de imóveis rurais cadastrados, somando 543 milhões de hectares. O setor aguarda a implantação dos sistemas de análise do CAR. As informações servirão de base para o Programa de Regularização Ambiental (PRA),quando for necessária a compensação de passivos ambientais.
O Serviço Florestal Brasileiro informou que está sendo desenvolvido um sistema de análise dinamizada dos dados do CAR, que será disponibilizado aos Estados, a quem compete a avaliação das informações. A expectativa, de acordo com a assessoria da instituição, é que a ferramenta esteja desenvolvida até o final do primeiro trimestre deste ano.
10. Passivo do Funrural
Desde quando o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a cobrança da contribuição para o Fundo de Apoio ao Trabalhador Rural (Funrural) está de acordo com a Constituição, o setor agropecuário vem tendo que lidar com um passivo bilionário. Promessa de campanha do presidente Jair Bolsonaro, a solução não veio, passado o primeiro ano do governo.
Autor de proposta na Câmara que elimina o passivo do Funrural (PL 9252/2017), o deputado Jerônimo Goergen (Progressistas/RS) cobra uma definição. “As promessas sempre são reforçadas, mas a solução não aconteceu”, disse, em vídeo postado em redes sociais, em dezembro, destacando que produtores não aderiram ao Refis do Funrural à espera de uma posição.
Recentemente, o parlamentar voltou a se manifestar pelas redes: “Chegamos num momento no qual não há mais espaço para paliativos. Ou o poder público atua de forma efetiva ou teremos vários produtores sendo excluídos da atividade com um enorme e impagável passivo, além de num cenário de abertura de importantes mercados não termos os resultados esperados”, afirmou.